"Estamos, e havemos de concordar, numa época em que o Fado goza - aparentemente - de boa saúde. Surgem constantemente caras novas, discos novos , novas vozes... Mas, como em muitos outros aspectos da vida artística nacional, o fado incorre num iminente processo de uniformização. As tão apregoadas novas vozes não se diferenciam de outras vozes já existentes. O Fado parece estar de boa saúde mas não tanto. Tem faltado originalidade, novidade e vozes que realmente se diferenciem.
Mas felizmente, há sempre quem esteja atento, quem olhe para o Fado pelos olhos de mais ninguém que não os seus, há sempre quem queira romper com estereótipos preservando aquilo que de mais sagrado o Fado encerra: a música, a poesia e o sentimento.
Segue a minha voz é, inquestionavelmente, um oásis onde os ouvidos - e a alma - podem escutar uma voz singular e repleta de uma renovada energia, bem demarcada e distante das vozes que actualmente proliferam no Fado. É impressionante o cunho sentimental que Gonçalo imprime nos seus Fados, força gravitacional que atrai o arrepio, a emoção e, porque não?, o sonho.
Deste seu segundo álbum destacam-se duas letras escritas por Amália Rodrigues - Canta Coração e Faz-me Pena; do cancioneiro medieval, numa adaptação de Natália Correia e Pedro Sena-Lino, Lá Vão as Flores. Gaivota Perdida, Meu Fado, Meu Doce Amigo e Leva-me Longe são entre outros, temas que se devem escutar com atenção.
Gonçalo Salgueiro trouxe novidade e encantamento ao Fado, trouxe-lhe carinho, honestidade e verdade e é sem dúvida dono de uma das melhores e maiores vozes do Fado... seja do Novo, seja do Antigo."
José Daniel Ferreira
Entrevista com Gonçalo salgueiro sobre o seu álbum "Segue a minha voz" retirada do jornal Audiência
"Gonçalo Salgueiro apresenta "Segue a minha voz". Um novo trabalho inspirado pelos compositores e poetas portugueses. Fado tradicional de uma voz que nasceu com Filipe
Audiência - Como é que surgiu a oportunidade de gravar este "Segue a minha voz"?
Gonçalo Salgueiro - O álbum "Segue a minha voz" surge de uma combinação de vontades, de momentos, de disponibilidades! A Maria de Lurdes de Carvalho e o Fernando Abrantes encarregaram-se de criar as condições necessárias para a sua criação bem como foram a sua força motriz, sobretudo no apoio e motivação que me deram… eles são os responsáveis pela existência deste álbum. na mesma altura proporcionou-se trabalhar com o Jorge Fernando, algo que sempre quis fazer, e que se encontrava disponível para me ajudar a criar este álbum, e… com esta equipa de sensibilidades e saberes… é fácil criar…!
A - Como é que defines este álbum?
GS - Como o próprio título sugere, é um passeio "por mim", pela minha forma de estar como homem, como artista, um acto muito pessoal de entrega ao fado, ao público que me acarinha e me levou a gravar todos estes temas, temas em que se encontram pedaços daquilo que sou e sinto… e é ao mesmo tempo um convite, aos que ainda não me conhecem e que como eu partilham o gosto pela música e pela poesia, e aos que me conhecem... que continuem a acompanhar- me neste meu percurso!
A - A grande referência do Gonçalo Salgueiro é a Amália?
GS - Para mim Amália e fado são sinónimos, já o afirmei muitas vezes, e se canto o fado foi porque me apaixonei por ela, pela sua alma, pelo seu enorme talento e carisma , pela humildade com que se manteve sempre fiel a si mesma, ao seu público e ao seu país! ela apropriou-se do fado e mostrou-o ao mundo, foi fonte de inspiração de tantos e tão grandes artistas (uma Diva… pena que este termo hoje esteja tão abandalhado… e mal empregue) , e daí que não é de admirar que seja também a minha grande referência! Pena tenho de nunca ter tido a coragem de lhe dizer pessoalmente o quanto a respeito e admiro… enfim…!!
A - No álbum constam poemas de Florbela Espanca, Ary dos Santos, David Mourão-Ferreira e Pablo Neruda. São influências ao nível da escrita?
GS - A escolha dos poemas nada teve a ver com o peso do nome dos seus autores, mas sim com o facto de me tocarem, de fazerem chorar, de me fazerem sonhar … são realmente mágicos, e só espero ter conseguido transmitir um pouco dessa energia com as minhas interpretações…
A - Sobressai ao ouvir o cd o timbre de voz. Sentes que tens uma voz diferente ou especial?
GS - É-me difícil responder a essa questão... não sei se tenho um timbre diferente ou especial… sei que tento fazer o melhor que posso com aquilo que Deus me deu…
A - Tiveste formação a nível da voz?
GS - Tal como os atletas, que todos os dias correm, a voz também deve ir aos treinos…, porém, ninguém nos ensina a cantar, ou se sabe ou não se sabe, e o cantar não é só voz tem muito mais que se lhe diga…
A - Já se percebeu que há público para o fado, mesmo para as novas tendências associadas. Mas há lugar para tantos fadistas? Sentes que o teu nome pode passar despercebido?
GS - Nunca deixou de haver público para o fado… não vai deixar de haver, o fado está nos nossos genes, é a nossa grande expressão cultural e como é óbvio haverá sempre lugar para aqueles que o fazem com verdade e entrega. Quanto a mim, desde que saiba que fiz chorar alguém... sei que tudo valeu a pena … canto por amor e não por ambição, daí que essas questões não me perturbem, mesmo nada…
A - Nunca vi um espectáculo teu mas quem já viu fala numa postura ousada. Que imagem transmites ao vivo?
GS - Hum! Postura ousada… não canto de mãos nos bolsos… e não tenho medo de me emocionar, procuro estar em sintonia com o pulsar do público, dar tudo o que tenho em todos os fados que canto… será isto ousar …?? Não sei, deixo essa questão para os entendidos…! Apenas sei que não imito ninguém e tudo o que faço é verdadeiro e com humildade.
A - Já pensas em gravar um novo álbum?
GS - Ideias tenho para mais 10 álbuns… mas gravar para já não!
Jorge Oliveira
Audiência"
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